terça-feira, 19 de outubro de 2010

Fonte: Página do Cinema

HOJE "É NO AMOR!"

Ator diz que foi difícil desconstruir o personagem do miliciano Russo

Usada por algumas religiões para descrever a situação em que um corpo recebe um espírito ou entidade, a expressão “incorporar” costuma ganhar sentido figurado quando o assunto é o trabalho de um ator. Na pele de Russo, o chefe da milícia de Rio das Rochas em “Tropa de Elite 2”, Sandro Rocha, porém, faz jus à aplicação literal do termo. Não apenas pela ótima atuação, que o transformou na grande revelação do longa, mas também pelo comportamento fora do set durante as filmagens. Liane, sua mulher há 13 anos, que o diga. Normalmente atencioso e afável, este carioca do Complexo do Lins de Vasconcelos mergulhou tão profundamente em seu personagem que passou a agir de maneira intempestiva em casa.“Desconstruir o personagem internamente foi difícil. Sofri bastante. Nossos filhos também sentiram. Trabalhamos juntos para reverter isso”, conta Liane Rocha, esposa de Sandro, referindo-se aos filhos Luiz Fernando, de 16 anos; Mariah, de 11; e Clara, de 9.

Confira cena em que Russo toma a cooperativa de vans na marra

O ator de 36 anos, que teve o seu primeiro grande papel no cinema e até o ano passado conciliava pontas na TV e filmes publicitários com a atividade de consultor comercial, admite que passou dos limites algumas vezes. As justificativas, porém, são tão convincentes quanto sua atuação. “Quando você sai deste universo em que você só dá ordens e manda até matar, não tem paciência para esperar um bife quando chega em casa. Eu sou visceral. Gosto de mergulhar de cabeça no que faço. Pra esse tipo de trabalho, ainda mais com a preparação da Fátima Toledo, ou você entra pra rachar, ou pede pra sair. Sonhamos sempre com uma grande oportunidade. Quando ela aparece, você tem de aproveitar”, explica Sandro, formado pela CAL, de Laranjeiras.

Ao compor o personagem – em suas palavras, a “encarnação da sacanagem” - Sandro valeu-se não apenas do contundente método da preparadora de elenco, mas também de características de figuras clássicas do cinema, como Don Corleone, de o "Poderoso Chefão", vivido por Marlon Brando, além de dados colhidas no relatório da CPI das Milícias e em vídeos do Youtube. A maior fonte de informação e emoção, entretanto, foram as situações traumáticas pelas quais passou no Lins, bairro cercado de favelas dominadas pelo tráfico, no qual Sandro foi criado e vive até hoje. Entre elas, tiroteios e invasões policiais, além da morte de antigos amigos que se tornaram traficantes: “Eu jogava bola no campo do morro. Tenho muitas referências dali. Nunca me interessei pelo tráfico por que tive uma boa educação em casa, mas muitos amigos se perderam nesse caminho”.

Para tentar evitar que o mesmo aconteça com outros jovens, o ator coordena o projeto social Ruah no bairro, em que 35 jovens têm acesso a alimentação, auxílio psicológico e aulas de teatro, entre outras atividades. “Por mês, custa R$ 60 mil, o mesmo preço de um fuzil, mas nenhum político se interessou até aqui”, afirma ele, cobrando ajuda do Estado.

Com o sucesso de “Tropa de Elite 2”, Sandro espera obter este apoio, além de impulsionar a carreira artística, a qual dedica-se exclusivamente desde o início das filmagens. Para começar, realizará o desejo de fazer teatro, o que era impossível devido aos compromissos como consultor comercial. Ao lado de André Ramiro, encenará a nova montagem de "Barrela", de Plínio Marcos, que narra uma noite violenta dentro de uma cela. O ator não esconde, no entanto, o grande desejo de voltar a filmar para o cinema, em que estreou fazendo uma pequena participação em “Tropa de Elite”, já interpretando o corrupto policial Rocha (ainda não apelidado de Russo).

Foi ela que valeu o convite para a continuação da franquia, feito, segundo o próprio ator, “aos 47 minutos do segundo tempo”, depois da desistência do profissional inicialmente escalado para o personagem. “Gostei muito dele no primeiro filme. Achei muito natural. Olhava para ele e via um PM. Sugeri ao Padilha após a desistência. Quando liguei para avisar que ele havia passado no teste, ele estava no Maracanã. Chorava feito uma criança”, conta Rodrigo Pimentel, ex-capitão do Bope e consultor da superprodução.

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